domingo, 14 de janeiro de 2018

Lampadário reúne contos de quatro décadas de produção literária de Gláucia Lemos, selecionados pela autora. Nas páginas desta antologia encontramos narrativas habilmente tecidas pela imprevisibilidade que, entre outros aspectos, conduz o leitor para um caminho desconhecido e/ou mágico.  A escritora organiza seus textos de modo que as informações são reveladas (pelo narrador ou personagens) aos poucos, como uma excelente jogadora cujo tabuleiro é a linguagem, sem preocupação com a lógica da realidade, exigindo o máximo de atenção do leitor.
As narrativas da autora de Todas as águas (2015) não somente  vencem por nocaute, como diria Cortázar, mas também socam-nos o estômago em alguns momentos e afagam-nos em tantos outros.  São textos densos que prendem a atenção do leitor e os presenteiam com intrigantes histórias e belas metáforas.
E a força das figuras femininas criadas pela escritora baiana?  São personagens que sabem suportar as dores e os infortúnios de seus destinos. Aliás, mulheres que tomam para si as rédeas de suas vidas, sejam por meio da vingança, da busca por seus amores ou da própria morte. Não há como esquecer a atitude de Lina em “lampadários do céu”: “ [...] a mulher levantou o braço, e, quase sem esforço, os pés apoiados nos dedos dobrados, apanhou a estrela mais próxima, de luz intensa como a de um lampadário. Soprou-a com força[...] E,  assim, foi soprando uma a uma, todas as estrelas do céu e as apagando.” (p.46-47). Raquel, em “as esmeraldas”, que inicialmente parece não ter força para ceder à exploração do marido, surpreende-nos ao escolher pagar um alto preço pelo que acreditava ser sua dignidade: “Fez um gesto de desolação, mas de repente ergueu a mão direita, retirou um dos olhos e entregou-o ao homem” (p.140).
Em contos como “as araras” e “o sinal de nascença”, por exemplo, o maravilhoso intriga o leitor (e os personagens). No primeiro acompanhamos as lembranças do personagem e somos levados a um salão inesquecível cuja localização não se conhece, mas traz uma enigmática prova daquele ambiente: “[...]duas araras vermelhas que acorrentara” (p.121). Em “sinal de nascença”, uma visita a uma antiga casa grande de engenho revela que a herança da personagem não se restringiu apenas aos bens materiais de seus bisavós.
Que a literatura produzida por Gláucia lemos é merecedora de elogios dos leitores e da crítica não é novidade. Mas é sempre uma agradável  surpresa a leitura de suas obras!